segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

A/C da mãe da Agatha e do André

Querida mãe da Agatha e do André,

Tudo bem? 
Não sei se é assim que devo escrever o nome da Agatha, mas como a minha mãe é super fã da Agatha Christie, fiquei com essa referência; se não for me perdoe é uma grafia afetiva, se é que isso existe.
Eu quis te escrever porque você tocou profundamente a minha vida, e acredito que você nem imagine. E talvez nunca venha a imaginar.
Nós nos encontramos, por no máximo 10 minutos, no banheiro familiar de um shopping center. 
Você caminhava à minha frente com seus filhos, e eu fui levar minha pequena que estava apertada, para o mesmo lugar que você estava indo. 
Eu notei você antes de nos encontrarmos porque você tinha um bebê no colo, mais uma mala de troca ao ombro. E ainda tinha uma criança pulando de alegria segurando a sua outra mão.
Quando eu a vi, sinceramente, senti compaixão. 
Pensei comigo, puxa que difícil, uma criança maior pulando, um bebê ao colo, mais uma mala pesada, é muita coisa para equilibrar. Isso numa praça de alimentação cheia de pessoas carregando bandejas, andando apressadas para lá e para cá.
Quando chegamos ao banheiro familiar, você já tinha se organizado para trocar a fralda do André. Eu e a pequena já estávamos lavando as mãos para irmos embora, quando você me pediu ajuda.
A sua pequena também estava apertada.
Ele estava no trocador e eu não sabia muito bem o que fazer. 
E você começou a conversar comigo, me explicou que sua família estava almoçando e que vocês (você, Agatha e André) já haviam almoçado. Você me perguntou como a pequena se chamava, e carinhosamente a chamou pelo diminutivo que mais gosto: Bela.
Em seguida, você me perguntou se a pequena era filha única, mas você fez isso com toda a delicadeza, sem cobranças, sem julgamentos. E me contou que a diferença de idade entre seus filhos é exatamente a diferença que eu teria entre dois filhos, caso eu decidisse engravidar mais uma vez.
Enquanto isso, o André me olhava com uma carinha de sapeca e sábio ao mesmo tempo, fazendo meu coração derreter de tanto amor. Foi a segunda vez que um André alcançou o meu coração assim. O primeiro foi o meu marido.
Você chamou a sua filha e pediu para ela ensinar a minha a como pedir um irmão para o Papai do Céu. Enquanto isso, a Isabela se derretia pelo André, dizendo que seria muito legal ter um irmão e que faria como a Agatha ensinou.
Você o tempo todo sorriu sinceramente, foi grata e me disse que eu tinha sido um anjo para você naquele momento. 
Eu sorri.
Mas a verdade é que o anjo foi você.
Antes do nosso encontro, a imagem que eu sempre tive de mães de dois, era de uma mãe esgotada, triste e exaurida pelo trabalho de ter dois filhos. Sempre tive medo disso. Não é assim que eu quero ser.
Ao te conhecer, ao ver sua delicadeza, sinceridade e leveza em lidar com as duas crianças, todos os meus medos escapuliram de dentro de mim.
Você - que eu nem mesmo sei o nome - se tornou um alguém muito especial.
Eu não sei se um dia eu serei mãe de duas crianças, mas quero - mesmo sendo de uma "só", ter em meu rosto o sorriso sincero, a delicadeza e a tranquilidade que vi em você.
Eu só segurei o André para você acompanhar a Agatha, mas quem foi ajudada de verdade, fui eu.
E serei eternamente grata!
Muito obrigada.

terça-feira, 15 de dezembro de 2015

hoje é o último dia de aula da pequena

Hoje é o último dia de aula da pequena.
Ano que vem ela começa o Ensino Fundamental 1, ela vai para o primeiro ano.
Um minuto de silêncio pela mãe que está em luto luta para descobrir como foi que os anos passaram tão rapidamente.
Obrigada.
Ela está curtindo ser grande, apesar de "sentir falta dos carinhos de bebê" - palavras dela mesma, saídas da boca dela, inventadas pela cabeça dela própria.
E eu estou curtindo ela grande, apesar de sentir muita falta daquela pequenininha que conheci há 5 anos atrás.
Ela se recusa a doar os brinquedos de bebê, e eu não vou forçar, eu ainda não consegui me desfazer nem do carrinho de bebê que continua no porta malas do carro.
Entendo-a bem.
Tem gente que me cobra um segundo filho, como se a saudade que eu sinto dela pequenininha fosse passar por ter um outro bebê.
Na minha opinião, a saudade só aumentaria com o tempo, pois seriam dois bebês para "saudadear".

Hoje é o último dia de aula da pequena.
Ela já sabe ler, já escreve foneticamente, sabe? Tipo escreve o som que ela escuta.
É tão fofo!!!
Ontem ela escreveu KONI (cone), BADEDI (band aid) e MUZIKA (música).
Ela também já faz pequenas adições, e está começando a compreender a subtração.
Ela já sabe se trocar sozinha, escovar os dentes sozinha, comer sozinha, se enxugar sozinha.
Ela já nada, toca piano e está aprendendo a língua inglesa.
Que pessoinha linda ela é.

Hoje é o último dia de aula da pequena.
Ela cresceu, e eu vi isso acontecer todos os dias.
Eu cresci, e eu vi isso acontecer todos os dias, também.
Ela cresceu, eu só não percebi.
Eu cresci, e só percebi agora.


sábado, 5 de dezembro de 2015

prêmio melhor mãe do ano

Dezembro é um mês recheado de festividades.
Temos os encontros de fim de ano das firmas, temos os famigerados amigos secretos, temos as apresentações escolares, temos os festivais dos esportes, as apresentações culturais e muitas outras comemorações lindas.
Mas existe uma premiação ultra secreta, que também acontece no mês de Dezembro, na qual uma única mãe no mundo todo recebe o desejado título de mãe do ano.
Eu, até hoje, só fui indicada a este título uma única vez.
Lembro-me com carinho de Dezembro de 2009.
Quando recebi o envelope de indicação, eu estava grávida pela primeira vez, cheia de sonhos, desejos e teorias perfeitamente selecionadas.
Quanta alegria! Foi uma honra ser indicada.
Mas não ganhei.
E não sei quem ganhou.
Ouvi dizer que as identidades das mães que são agraciadas com o título, são protegidas pelas agências de segurança mais importantes do mundo.
Reza a lenda que as mães fazem parte de uma espécie muito feroz e agressiva, que muitas vezes julgam com voracidade umas as outras, e por esta razão, os criadores da premiação optaram por proteger a identidade das ganhadoras.
Mas voltando a minha indicação.
Desde àquele Dezembro de 2009, eu nunca mais fui nomeada.
Mas todos os anos, me esforcei grandemente e arduamente, para desempenhar meu papel de melhor mãe do mundo. Para que no momento em que eu finalmente recebesse a honraria, eu teria a minha consciência tranquila de que eu realmente a merecia.
O que eu preciso contar é que em Dezembro de 2009, eu achava que teria um menino - seria o Enzo, ou o Felipe, ou o Pedro, ou o Davi - eu não sabia o nome da criança. Isso me custou menos 10 pontos na avaliação final.
Naquele Dezembro, os presentes de Natal foram um carrinho roxo e um vestidinho (que a vovó comprou achando que era um body). Isso me custou mais 30 pontos. Eu cogitei pedir um nova contagem, até porque alguns meses depois do Natal, eu descobri que teria uma menina e não um menino. Então, não foi algo tão grave assim.
As minhas teorias sobre os cuidados gestacionais, parto e cuidados com o bebê, eram coerentes com os ensinamentos dos livros, mas não eram aplicáveis a realidade de ser de fato uma mãe de verdade. Eu acho que isso foi dureza de julgamento dos juízes, afinal eu ainda não tinha experiência.
Por fim, minha colocação foi prejudicada. E eu perdi.
Passaram-se 2010, 2011, 2012, 2013 e em Dezembro de 2014, quando mesmo fazendo todo o esforço para receber o título de melhor mãe do mundo, já exaurida de tantas regras, tantas ordens, tantas ansiedades, medos e culpas e ainda assim, novamente sem a indicação para o prêmio. Eu tomei uma decisão.
Não vou me candidatar.
E vivi 2015 assim, sem mirar o prêmio.
Eu acudi só as coisas que eu realmente conseguiria acudir.
E para as coisas que eu esqueci, ou não que dei conta, pedi ajuda.
A mancha do uniforme não saiu na primeira, na segunda, ou mesmo, na terceira lavagem? Sem problemas, vai de uniforme manchado para escola. A propaganda do sabão em pó fala que criança feliz é criança suja. Beleza, vou acreditar.
A escola mandou bilhete avisando que precisa de latas de leite em pó, mas a gente não toma leite em pó em casa. Antes, desespero. Em 2015, pedi ajuda no milagroso grupo de mães da escola. A pequena fez a atividade com o patrocínio latístico da família de um amiguinho da classe.
Os prazos da escola, da natação, da vida e da rotina foram atendidos quando possíveis, e não no primeiro dia após a solicitação. Perdi alguns prazos, mas priorizei aqueles que eram mais importantes. E os que eu perdi, eu dei conta de arcar com as consequências.
Foi MUITO difícil para mim me desapegar do prêmio tão almejado por tantos anos.
Mas a minha confissão mais verdadeira é que foi mais leve.
Essa semana, conversando com a professora da pequena, me desculpei pelas milhares de falhas no ano, e disse que esse ano tinha certeza de que não seria ao menos indicada ao prêmio de melhor mãe do ano. E ela me acolheu.
Ela me disse que ela também não estava concorrendo. E que ela já tinha sido avisada que parar de entrar na disputa é o melhor sinal de saúde que uma mãe pode ter.
Então, é isso.
Mais um Dezembro chegou e eu não fui indicada à premiação.
E, hoje, estou muito feliz com isso!
Um brinde à saúde!

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

o adulto dessa criança

Um dos passeios preferidos aqui em casa é ir em livrarias.
Nós amamos! Quando temos tempo, nós vamos às livrarias, escolhemos os livros e vamos lendo e formando uma pilha de livros. Aqueles que a gente mais gosta, a gente traz para casa.
Dia desses, estávamos numa livraria, sentadas no chão, com vários livros lidos e escolhendo mais alguns. E eu não pude deixar de escutar a conversa da vendedora com uma cliente.

Vendedora: Boa tarde, eu posso ajudar?
Cliente: Sim, estou procurando um presente para um sobrinho.
Vendedora: O adulto desta criança tem o hábito de ler para ela?

Nesse mesmo instante, ouvi um disco arranhado dentro de mim.
Oi? O "adulto dessa criança"?
Duas questões me saltaram à mente e soaram estranhas para mim.
A minha primeira foi de pensar que vivemos em um mundo tão chato, mais tão chato que já não é mais politicamente correto perguntar se os pais da criança gostam de ler para ela.
A segunda questão se relaciona com o fato de que a expressão "o adulto dessa criança" é profundamente desprovida de afeto. É como se não existisse nenhuma relação entre este adulto e esta criança. É uma relação impessoal. É como se qualquer adulto pudesse ser O Leitor para a criança.
Ler para uma criança é algo mágico, os olhinhos brilham, a imaginação voa solta. É um momento muito especial. E essa leitura mágica, só acontece quando há uma relação entre o leitor e ouvinte. Os contadores de história que me perdoem (amo levar a minha pequena para ouvi-los e ela ama ouvi-los), mas quando sou eu e/ou o papai que lemos a história... a reação é outra.
A conversa entre a vendedora e a cliente terminou assim:

Cliente: Sim, minha irmã lê bastante para ele.
Vendedora: Ah, que bom! Caso contrário, eu sugeriria para comprar um brinquedo. Ele aproveitaria mais sozinho.

Aí, me contorci inteira!
Atrás de uma expressão politicamente correta, se escondia uma conduta superficial. Se o objetivo é construir um futuro onde as crianças tenham o prazer de ler, mesmo que o pais ou demais responsáveis (me recuso a usar a expressão da vendedora) não tenham o hábito de ler para a criança, então, ganhar um livro é algo bastante sugestivo para adquirir o comportamento.
Enfim.
A pequena saiu da livraria depois de 10 livros lidos, gostou de todos, mas não amou nenhum para ler várias vezes. Ela veio com a cabeça cheia de histórias e com a imaginação aquecida.
Por outro lado, eu saí de lá com um barulho ensurdecedor dentro de mim: "o adulto dessa criança?" - não é isso que eu quero ser para a minha filha.
Eu quero sempre ser a mãe, A MÃE da minha filha.
Com todo afeto e limites que esta relação merece e deve ter.
E eu espero, com todo o meu coração, que você nunca seja o adulto de uma criança.